domingo, 7 de outubro de 2012

Camafeu

Não é o meu melhor. Sei que mais posso e mais sou. É fato que a vida ronda, muito mais que a morte, o limite do meu Eu. No entanto, busco a sorte como forma de combate e me vejo em alto relevo retratada num camafeu. Ah! Insano mundo que gradeou meu olhar numa viseira de breu. Voilà! É que a garganta expele grunhidos enrouquecidos e febris de solidão. Desconheço o meu melhor porque busco inconstância na obstinação que emana do lírico amor de Orfeu. Não existe mulher Eurídice. E nem o sal que ardeu suas entranhas é o mesmo sal que me ardeu. Não sei do meu melhor. Pode ser que ressurja do nada faça-me e me desfaça e novamente me dê adeus! Ou, quem sabe, o melhor já esteja e me faça menos excêntrica, mais vital, mais essência e nunca mais, camafeu!

Aptidão

Havia essência. Incontestável. O azul tornou-se amarelo sem perder a linha. A tênue linha que digeria a íris. E que através do revés acenava adeus. Sem convés. Havia o antes. Sempre há. Onde brilhos cegavam. E a cegueira, faminta, fazia o jogo de quem é mais. Eu, tu, eles? Nós? Ais aos sais. Fuligem adesiva. Na pele, um conto. Pesponto. De ré à primeira. E o castelo, incompleto, abriu-se inconteste. Reverências ao capaz.

domingo, 4 de março de 2012

Visionária


Há letras tortas
Quase tecidas
Pontos em cruz
Vírgulas escondidas.
Há Alfa, Beto e José
E nas Marias esquecidas,
repletas de bem-me-quer,
exaustas de cicatrizes,
há ninhos repletos,
coberturas de sapé,
travessas paralelas,
ipês ao pé da serra,
luares e cafunés.
Marias também malditas
da beira do cais
dos vinhos baratos
Marias dos canapés...

Significância


Não escolhi ser pouco
Nessa gama de frases reflexivas
De frases incompletas
De pensamentos livres
Preciso dominar as palavras
Dar-lhes vestimenta nobre
E desfazer o tosco.
Que difícil é.
Não poder pintar a boca da noite
Não poder marulhar às estrelas
Como acolher as expressões que me acenam?
Não quero ser pouco
No entanto não controlo a inércia
- Árdua insistência
- Insensata permanência
Mera sorte descobrir significados
Para a insuportável falta de lampejos.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Riacho Doce


água doce do rio
no molejo dos olhos
traz pétalas navegantes
que se acomodam tranqüilas,
nas inúmeras orlas dos cílios

olhar de cachoeira,
brilhante no sol a pino,
embala pétalas soltas
que dormitam sossegadas
nas curvas, formando fios

E criam desenhos de sonhos
evocam amores distantes
nas águas doces do rio

Mensageiras da esperança
as pétalas liberam aromas
tão doces quanto os amores
acolhidos à beira do rio

e a poesia rola solta
na pele umedecida
pela doce água do rio.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Se


Se tu pudesses, tu virias comigo.
Se o acaso não fosse plural
Se o momento acontecesse
Se o mundo aquietasse.
Mas tudo voa mesmo sem asas
E a chuva molha até as saudades.
Se eu pudesse reter o sal
para que o tempero se apurasse...
Ah, se eu pudessse!
O meu desejo expandiria além
muito além do tênue limite
entre razão e emoção.
Por isso, no *se* dos *ses*
que nos acontecem
nas exclamações sentidas
nas interrogações expostas
Te levarei em versos doces
sem qualquer rima
E voltarei sempre pronta
já que a bandeira
fincou no solo
e por nós tremulará
mesmo que dolentemente
porém, serena,
como se tivesse
a nos esperar.

Sinopse


Alguns versos estavam partidos, outros a caminho e, no entanto, nenhum se recuperou.
Fiquei como sempre... trombando em minha sombra e desafinando a melodia.
Não havia um recato, nem uma omissão. Havia um quê de afeto desviando a confusão.
Não estava em transe, não dancei um rock, não sonhei em vão.
Tudo estava entre as esquinas e entre o caótico silêncio que não consegui traduzir.
Se os deuses fossem humanos, de certo os encontraria doando revistas pornográficas enquanto seus palácios cintilavam hipocrisia.
Não sei mais de mim.
Estive? Estou? Onde?
Hoje nasce. Um redemoinho de emoções simplesmente aniquila-me.
Sinto como se tivesse sido lançada a um mundo que não me pertence.
Sou impura demais para ele?
Porque não há pureza alguma sobrando em mim...
Como saberei se devo ou não transpor a fronteira?
Entre a dúvida, salto a fogueira.
Pelos chamuscados, cheiro de enxofre... Ops!
O paraíso é mesmo aqui...