sábado, 19 de março de 2011

Canção do Amanhecer


Mãe Terra
Mãe Lua
Mãos que colhem
Mãos que expurgam
Terra que alimenta
Lua que vislumbra
Pelo mar que invade
pela luz que ofusca
na Mãe Terra
que produz
raízes para
sustentar o mundo
há uma Lua
deserta
chorando muito profundo
Mãe Lua
libertai-me
deste sonhar absurdo.
Dai-me o Sol acolhedor
o cantar do vento nas curvas
e o abraço do amanhecer
em cada solene segundo.

Revoada


Senti o teu regresso como uma melodia.
Como um déjà vu inexplicavelmente explícito.
Sombras dissipadas retomando formas fizeram-me sorrir.
Não eram caricaturas.
Eram formosas e possuíam essência.
Um suave gosto de menta invadiu meus lábios
E pude então dizer teu nome
em monossílabo, em suspiros, em êxtase!
Vieste com os pássaros migratórios
E pude, então, te suprir de amor.

terça-feira, 15 de março de 2011

Sob a janela, as cordas


Um perfume de acácias
e uma primavera de ventos frios.
Sob a janela os acordes de dedos ágeis
perfuram minha alma e me fazem sonhar.
Todos os sonhos de uma natureza
que adormece sombreada por nuvens...
Todos os meus sonhos, envoltos na singeleza,
procuram o branco do luar.
E a música das cordas baila com o vento
entra em minha veia, corrompe os meus sentidos
e o pulso antecipa.
Sonoridade. Noite bela.
Sob a janela
cordas me enfeitiçam.
Semitonal perfeito.
Asas aos sonhos
porque esta noite
o vento, rarefeito,
parou para escutar...

Crepúsculo


Foi ótimo que estivesse aqui quando despertei.
O dia tornou-se agradável com a sua presença.
Às vezes me questiono o fator tempo.
Vivo a procura do meu.
Está perdido? Camuflado? Sequestrado?
Sei que não caberia uma definição.
Eu mesma enrolo-me em espiral.
Porque é menos dolorido eu me culpar
por não retê-lo, do que aceitar que ele se foi.
E é absoluta essa certeza que ele não volta.
Não mesmo. O tempo não volta.
Eu sei que você sabe.
Se ele voltasse, garanto a você,
eu alteraria os ângulos.
É por isto que eu lhe disse
que às vezes (só às vezes) me questiono.
São milésimos de segundo.
Coisa pouca.
E nessa coisa pouca, vasculho uma eternidade.
Mudo a cor, a textura, o sabor.
E o crepúsculo torna-se confortável e deleitável
Como esse chá que tomamos enquanto a noite desperta.

sexta-feira, 11 de março de 2011

Amor Antigo


Que idade eu teria na época?
Uns oito anos, talvez.
Lembro-me de estar jogando bola
Um vôlei completamente errado
Quando chegou minha vez de rebater
A bola foi tão para o alto
Que eu, ao olhá-la, caí de costas.
Foi nesse exato momento
Que descobri o céu.
E enamorei-me dele para sempre.

Inacabado


É um assombro.
Tinha certeza que, dentro de mim, havia dizimado alguns quereres.
Realmente não os dizimei. Estão latentes.
Por que então será que cometi um desatino tão intenso?
Cobrir uma cascata que jorrava com que tipo de vegetação?
Sei que cobri. Eram pinheiros, jatobás, carvalhos...
Cercados por azáleas e visitados por pássaros migratórios.
Nem pousos faziam, porque toda a água estava submersa.
Somente raízes é que saciavam a sede.
E foi por amor. Sempre é por amor.
E o que amamos?
Sem questionamentos, tudo. Céu, terra, mar.
Universo. Seres vivos e inanimados.
Temos um potencial infinito de amor.
E devido a esse potencial, fazemos nossas escolhas.
Vou amar o feio, o bonito, a cor, a falta de cor,
o claro, o escuro, a vida e a morte.
Queremos amar. E muito.
É como se o brilho do olhar, o sorriso cálido, a
voz serena, fossem quesitos de suma importância.
E são.
Dentro de cada um de nós, não há espaços sólidos.
Há espaços movediços.
E quando deslizamos e ficamos presos neles o que poderá acontecer?
Não sabemos se não deslizarmos.
E deslizamos, nos prendemos, fixamos, até sentirmos asfixia.
Muitas vezes não sabemos nos soltar.
E ali mesmo, morremos.
E foi o que pensei quando decidi dizimar quereres.
Só que me enganei.
Meu potencial de amar não é tão restrito.
Abrange uma infinidade de poderes.
Posso, sim, amar a boca da noite.
O grito do dia.
A voz do silêncio.
Posso amar a antítese até o máximo do grau Celsius.
Amar até o meu desamor, quando ele acontece.

Percepção Noturna


Tateando o abstrato
tropeço no espaço
ouço eco de um abraço.
Apago a luz da candeia
e próxima à soleira
vejo o finito da rua.
Uma poça d’água trêmula
reflete a Lua cheia
amando o céu estrelado.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Motim


De repente ouço luzes
Meus olhos dizem loucuras
E minha boca se cala

Minhas mãos andam perdidas
Meu coração suspira
E minha boca se cala

De repente paro o tempo
Meu beijo voa ao vento
Meu mundo na ante-sala

Meus pés dispensam a busca
Meu ventre, sem véus, estremece,
Meu sonho rejuvenesce.

Minha alma exporta o silêncio
A minha pele traduz incêndio
E minha boca já não se cala.

Tua voz invade meu templo
Aconchega-se em meus seios
E em minha boca se instala.

E juntos treinamos o amor
Surtos de kama sutra e cabala
Além do querer que exala,

Minha boca, então, fala.

quinta-feira, 3 de março de 2011

Eu coexisto


Coexisto na alegria e na tristeza.
E no excesso, coexisto na busca e na desistência.
É pouco o tempo que utilizo para parar de pensar.
Se for relativo o finito, se é imaginário o infinito,
por que não ser possível a metamorfose no risco?
Busquei flores em pedras e rasguei poemas inteiros
mas afirmo que no meu jardim há primavera o ano inteiro.
Sou assim: metade arte, metade imperfeição.
A me ver refletida no espelho
a amostra primeira tem cor de alma
as outras, lampejos de florescimento.
Faço, refaço e me transmuto
porque sou a filha do vento.
Muitas vezes forte outras vezes frágil
luto contra o esquecimento.

terça-feira, 1 de março de 2011

Você sabe!


...deveria ter compartilhado da minha vida.
Seríamos os mais loucos neste mundo de loucos.
Juntos, beberíamos de toda água
Inclusive daquela água que nos alucinaria
Nós não iríamos sós ao mundo da lua
Levaríamos um contingente enorme de insanos conosco
Tocaríamos harpa com os anjos
Cearíamos com os deuses
Ah! Mas você não percebeu...
Passou por mim e nem me viu...
Lembra? Eu era aquela que você evitava
A que conversava com os peixes
A que fazia versos para os enclausurados
A que libertava os pássaros do cativeiro
Você não quis viver comigo o amor
Faltou-lhe a ousadia do guerreiro
E faltou-lhe coragem, tão necessária,
de enlouquecer de amor por inteiro!